Texto: Luís de
Matos
Fotos: Luís de
Matos, Maria José Lopes e Ana Sofia Matos
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Fotos: Trajecto.
Enquanto escrevo estas linhas iniciais,
leio as últimas notícias sobre a erupção do Bárðarbunga, um sistema vulcânico com
duas centenas de quilómetros de comprimento e vinte e cinco de largura sob o glaciar Vatnajökull. Ainda todos
nos lembramos do caos criado pela erupção do Eyjafjallajökull, em 2010… Não
chegámos a assistir a erupções “visíveis” do Bárðarbunga, mas a sua actividade
sob os gelos acabou por impactar nas escolhas dos nossos próprios trajectos.
É
que este ano, o nosso “Pantera Negra” levou-nos até à Islândia, passando a
vinte e quatro o número de países que com ele já visitámos. Portugal de
“lés-a-lés”, claro está, mas também Marrocos, Espanha, Principado de Andorra,
Grã-Bretanha (incluindo as Highlands da Escócia, as ilhas Hébridas e
Gibraltar), França, Principado do Mónaco, Itália, Bélgica, Grão-Ducado do
Luxemburgo, Principado do Liechtenstein, Holanda, Alemanha, Dinamarca,
Finlândia, Suécia, Noruega (onde fomos mesmo até ao Cabo Norte!), Áustria,
Suíça, Eslováquia, Hungria, Croácia, Eslovénia… e agora, a Islândia!
Em
miúdo, claro, não perdia uma obra de Jules Verne. Muito provavelmente, o meu
primeiro “contacto” com a Islândia foi quando o autor usou o glaciar
Snæfellsjökul como cenário para o início da sua "Viagem ao Centro da
Terra". Na história, um geólogo alemão e o seu sobrinho embarcam numa
jornada épica para a cratera do vulcão Snæfells, guiados por um estranho texto
islandês do século XVI:
"... Desça até à cratera de Yocul de Sneffels,
que a sombra do Scartaris acaricia, antes das calendas de Julho, viajante
audacioso, e vai chegar ao centro da terra. Eu fiz isso..."
Arne
Saknussemm
Foto: "Viagem ao centro da terra", Jules Verne, edição Círculo de Leitores.
Depois, o Manolo e uns quantos aventureiros lembraram-se de escrever na extinta revista “Espírito Land” um artigo sobre a viagem que fizeram em Land Rover, a partir de Portugal, até à Islândia… e pela Islândia. Para cúmulo da provocação, a imagem de capa ostentava um Range Rover Classic idêntico ao “Pantera Negra”! A Land Rover Owner International também alinha na onda de provocações e, vai-não-vai, publica artigos de viagens à tal “Terra do fogo e do gelo”! Os fotógrafos, a começar pelo nosso Joel Santos, estão sempre lá batidos e a publicar fotografias e vídeos! Até a “sétima arte” por lá rodou cenas do “Batman”, do “007”, do “Super Man”...!
Um
indivíduo tem de se controlar, certo… Mas ninguém é de ferro!
E
ficou decidido! Para “curar” de vez o problema, nada como planear e fazer uma
viagem familiar até à Islândia, a bordo do nosso fiel amigo e companheiro de
muitas aventuras, o “Pantera Negra”!
A Islândia
é, em grande medida, natureza, paisagem, sensações! Um país espectacular. Uma
ilha geologicamente jovem que é um deleite para os sentidos e uma permanente
“aula” de natureza e geologia aplicada. Os islandeses são um povo impecável. Há
mais de um milénio que convivem com os caprichos da natureza e ensinam-nos
verdadeiramente o significado de “recomeçar”. Só no século XX tiveram trinta e
nove erupções vulcânicas, algumas com significativo impacto… Mas, como referia
o documentário sobre a última erupção do Eyjafjallajökull, “life must go on”!
Imperdível!
Mas recomenda-se que se leve ou alugue um “jipe”. É que nem todas as estradas
estão asfaltadas (a própria via principal do país, a “Ring Road #1”, não está
completamente asfaltada) e, em muitas das ditas “estradas” não asfaltadas, não
são sequer permitidos veículos de tração simples… É que muitas das vias são
mesmo “exigentes”… e um apreciável número dos rios glaciares não tem pontes. Por
questões de protecção ambiental, é estritamente proibido fazer
todo-o-terreno...
:-)
Dependendo
do que se pretenda fazer, recomenda-se também algum planeamento e dois dedos de
conversa com os nativos... Por exemplo, deixei de lado a ideia inicial de
percorrer um dos troços da rota de montanha Sprengisandur, que pouca gente faz
e que implica uma travessia a vau um pouco mais complicada (entre as várias que
se têm de fazer). Falei várias vezes com os elementos da “Venture 4x4” e da
“Extreme Iceland” (super-impecáveis!) que, de todo, não me aconselhavam a fazer
esse troço a “solo”. Por fim, referiram-me que se o veículo não fosse muito
baixo e atravessasse esse rio logo de madrugada (para minimizar os efeitos dos
desgelos diurnos), não deveria ter grandes problemas…, etc. e tal... Fiquei na dúvida sobre o que é que se entenderia
verdadeiramente por “… se o veículo não
fosse muito baixo…”
Enviei-lhes
uma fotografia do “Pantera Negra”… e eles enviaram-me a fotografia do carrito
deles… Ok! Fiquei esclarecido…
:-)
Foto: Porque há "jipes"... e "super-jipes"...
Pelo
sim pelo não, instalei a aplicação “112 Iceland” no telemóvel e levei, também,
um telefone satélite… just in case…
Góða ferð!
Fotos: Tudo a postos! E a data que nunca mais chega...!
Primeira etapa, de
Abrantes a Seyðisfjörður
– Atravessar meia
Europa e meio Atlântico –
O
trajecto até ao norte da Dinamarca, onde se embarca no ferry-boat com destino à Islândia, já era nosso conhecido dos
tempos da viagem ao Cabo Norte. Como habitualmente, dividimos o trajecto, com
umas paragens maiores a meio. Este ano elegemos para essas paragens, Versailles,
que a nossa filha já conhecia mas nós ainda não, Brugge e Amsterdam, já no
regresso.
Saímos
de Abrantes já não muito cedo e atravessámos Espanha sem nos determos muito.
Queríamos chegar à zona de Biarritz, mais precisamente a Bidart, a tempo de um
belo mergulho de final de tarde. Soube pela vida! As águas do Golfo da Biscaia
estavam a temperaturas muito próximas das do nosso barlavento algarvio e, como
ainda estávamos a meio de Julho, não havia muita gente. A zona é uma das
“Mecas” da malta do surf e coisas do
género, pelo que a praia estava dividida por zonas…, restando para quem
quisesse dar um mergulho apenas uma estreita faixa de mar… Se a moda pega cá
pelas nossas latitudes, a coisa vai dar “sarrabulho”!
Fotos: Biarritz.
Na
manhã seguinte, rumámos calmamente à zona de Paris, mais propriamente a
Versailles.
De
permeio e seguindo as instruções da sinalização de limites de velocidade nas
auto-estradas francesas, tentámos comprovar o postulado na sinalização sobre o
efeito da velocidade do “Pantera Negra” na produção de chuva… É que tal como
foram desenhados os símbolos, a sequência lógica da leitura é a inversa da
pretendida pelo legislador… Olhando para os ditos sinais e seguindo a ordem
normal de leitura ocidental (da esquerda para a direita e de cima para baixo),
não ultrapassando os 130 km/h a meteorologia não seria afectada, mas, mal
descêssemos abaixo dos 110 km/h teríamos chuva! Ainda elaborámos umas quantas
análises rebuscadas à implícita relação de causa e efeito, ainda aplicámos o
método científico, variando a velocidade, na tentativa de demonstrar o postulado
pela sinalização…, mas tivemos sempre bom tempo!
Foto: A tal sinalética francesa... ao contrário.
E
chegámos a Versailles…
Quem
visita o chatêau de Versailles, regra
geral, acaba por perder uma visita à própria povoação, hoje um subúrbio da
capital. Dedicámos portanto dois finais de tarde e noites a desfrutar de
Versailles propriamente dita, uma povoação bonita, acolhedora e plena de vida.
De “permeio”, visitámos o chatêau e
os seus “domínios”. Em viagens anteriores já tínhamos visitado alguns chatêaux da zona do vale do Loire e
algumas impressionantes tentativas de imitação levadas a cabo pelos Habsburgos,
mas… Versailles é Versailles!
Fotos: Versailles.
Durante mais de um século, entre 1682 e 1789, a Corte de Versailles foi o centro do poder do “Ancien Regime” francês e um símbolo da Monarquia Absoluta, essencialmente corporizada no reinado de Luís XIV, o “Rei Sol”. Com uma história riquíssima e considerado um dos maiores do mundo, o chatêau de Versailles impressiona em tudo, até nos seus “números”… 2.153 janelas, 67 escadas, 352 chaminés, 700 quartos, 1.250 lareiras e 700 hectares de parque. Chegaram a trabalhar e viver em Versailles cerca de 36.000 pessoas.
Ignorámos os sábios conselhos da recepcionista do hotel e
decidimos não madrugar nas portas do château…Tivemos
assim de arrostar com filas intermináveis no terreiro de entrada mas, surpresa,
muito bem organizadas e bastante rápidas. Em menos de uma hora já tínhamos
entrado! Para quem possa, Versailles não se esgota numa visita de um dia. Mas
para um primeiro amuse bouche, um dia
de visita é uma aposta equilibrada e que vale bem a pena! Os melhores dias para
visitar o château de Versailles são
as Terças-feiras, as Quintas-feiras e as Sextas-feiras, pois têm menos gente.
Fotos: Chatêau de Versailles.
Versailles, mais propriamente o hotel que nos serviu de base, teve também a honra de servir de palco a duas histórias tontas, entre as inúmeras que sempre pontuam as nossas viagens… a história das chaves e a história do elevador.
A história tonta das chaves…
Bem…
Neste tipo de viagens, o nosso fiel “Pantera Negra” vem sempre carregado de
todo um lote de tralhas inimaginável. Temos melhorado e muito a coisa, mas
ainda assim, entre o que “vai de certeza” ser necessário, o que “talvez vá” ser
necessário, o que segue o adágio do “homem prevenido vale por dois” e aquela
mania de fazer viagens entre zonas geográficas com extremos climáticos…, o
bicho quase que vai sempre “com a casa às costas”!
Escusado
será dizer que não levamos toda aquela tralha para o quarto em todas as
pernoitas! Se alguma coisa for necessária… dá-se um salto à garagem. Óbvio!
Vendo-me
já um pouco agastado do vai-e-vem entre o quarto e a garagem do hotel, a buscar
coisas que o “team feminino” se havia esquecido, a “mais velha” resolveu lançar
um resoluto “Pronto, eu vou lá!”…
Mais uma troca de galhardetes sobre planeamento e saber-se o que se precisa, e
acabo a disparar… “Sim? Vais lá? Muito
bem, mas o
jipe está fechado!”… A que, muito petulantemente me responde… “E a chave, serve para o quê?”… Apanhei-te, pensei eu! A chave do
“Pantera Negra” estava comigo e, comme
d’habitude, voltava a ter de ser eu a ter de ir armado em “buro de carga”
buscar coisas ao carro… “Ai sim? E qual
chave, posso saber? Mostra lá a chave! Mostra!”… E ela vai, abre a
carteira… e mostra-me a chave de reserva, que trazemos sempre nestas viagens…
Hummpff! Não me tinha lembrado da chave de reserva…
A história tonta do elevador…
Entre o
que se pensa, o que se pretende dizer, o que se diz… e o que sai da nossa boca
e é entendido pelos demais, vai, às vezes, uma enorme distância…
Subíamos
para o quarto, após o pequeno-almoço… Alguém chamou o elevador, para descer…
Abrem-se as portas e vemos uma família, rodeada de malas, com ar de quem queria
descer à recepção para fazer o check-out…
No meu melhor e mais agradável francês, digo-lhes simpaticamente que “Vai subir”… Pois! Mas a garganta e as
cordas vocais às vezes pregam-nos partidas, prendem-nos e distorcem-nos a voz
e…, ao que tudo indica, aquela supostamente suave, agradável e meramente
informativa frase, deve ter soado à pobre família como uma voz de comando de um
qualquer general irritado, em pleno campo de batalha e indignado pela ousadia e
irresponsabilidade daqueles seres abjectos, manifestamente inferiores que,
imagine-se, se atreveram a carregar no botão de chamada do elevador! Os seus
olhares assustados, num misto de espanto e incredulidade, pediram as “devidas
desculpas”. Só queriam descer para a recepção… Ok! Ainda hoje, lá por casa, me
gozam pelo meu célebre “On va monter…”.
Mas ficou a lição!
Deixámos Versailles no dia seguinte e, durante vários quilómetros,
fomos acompanhados pelos veículos da Federação Portuguesa de Pesca, os últimos
com matrícula portuguesa que veríamos durantes os próximos milhares de
quilómetros! Seguiram no sentido de Gent e nós virámos para Norte, prologando a
nossa “imersão histórico-artístico-cultural” com uma passagem por Brugge,
visita à cidade e aos seus pontos e monumentos mais emblemáticos, subida à
torre de Belfort (que encerra às 16h00!) e passeio de barco pelos canais
(Brugge é também apelidada de “Veneza da Flandres”). Embora tenha estado em
trabalhos de restauro, também nos foi possível visitar a Igreja de Nossa
Senhora (Onze-Lieve-Vrouwekerk), mas já não conseguimos ver a “Nossa Senhora
com o Menino”, de Miguel Ângelo (a única das suas obras que saiu do que hoje é
a Itália, em vida do artista!), pois essa secção encerrava mais cedo e não nos
apercebemos disso… Uma nota curiosa para o comando do carrilhão da torre de
Belfort, que nos recordou, a uma escala maior, os mecanismos musicais que
havíamos visto no “Museu da Música Mecânica”, de Varkaus, na Finlândia.
Sem grandes registos históricos durante os seus primeiros tempos
de existência, Brugge conheceu uma autêntica era dourada entre os séculos XII e
XV, em que se tornou na capital comercial da Europa com o próximo e médio
oriente, via Mediterrâneo. Constituiu-se
também aqui a primeira bolsa de valores do mundo, onde se transacionavam importantes
documentos comerciais (e.g., letras
de câmbio e hipotecas) que eram a base do capitalismo medieval.
Mais
uma daquelas cidades em que, pelo menos no Verão, não nos importaríamos mesmo
nada de viver e trabalhar… e onde, numa das suas pracetas, nos serviram os
melhores mexilhões que alguma vez tivemos a dita de provar!
Fotos: Brugge.
Depois destes dois dias de “interlúdio” havia que “voltar à estrada”. Com as habituais paragens curtas “aqui e acolá”, já fomos pernoitar a Flensburg, a meia dúzia de quilómetros da fronteira dinamarquesa. Uma simpática e bem organizada cidade costeira, no Flensburger Förde, que foi sede dos últimos dias do governo da Alemanha nazi, entre 1 de Maio de 1945 (morte de Adolph Hitler) e a dissolução desse governo, a 23 de Maio do mesmo ano.
Fotos: Flensburg.
No dia seguinte chegámos ao topo Norte da Dinamarca, a Hirtshalls, não sem antes termos feito um pequeno desvio em Horsens para visitarmos o Jonas, o mecânico que tanto nos ajudou na nossa viagem ao Cabo Norte, em 2011.
Na
última vez que tínhamos estado em Hirtshals, quando da nossa viagem ao Cabo
Norte, com todas as peripécias em torno da avaria do “Pantera Negra”, não chegámos
a conhecer a zona. Desta vez chegámos por volta da hora de almoço (um almoço
tardio, claro!) e pudemos deambular calmamente pela povoação e arredores. Marcada
profundamente pelas reminescências da segunda guerra mundial, Hirtshals tem o
maior porto de pesca da Dinamarca, e aqui são também asseguradas ligações de ferry-boat para a Noruega, Suécia, ilhas
Faroe e Islândia.
Não
podíamos também deixar de dar um bom mergulho de final de tarde nas águas do
Mar do Norte! A “corrente do golfo” faz-se ainda sentir a estas latitudes e a
temperatura das águas não envergonha.
Fotos: Hirtshals.
Em Portugal é, e muito bem, proibido conduzir nas praias e nas zonas dunares. São zonas muito sensíveis em termos ambientais e, especialmente durante a época balnear, levantam-se também problemas óbvios de segurança. Qual não foi o nosso espanto quando, depois de termos estacionado ordeiramente num parque de estacionamento praticamente vazio, vimos a praia de Hirtshals pejada de veículos! Até autocarros lá iam dar a volta! Sem exagero, algumas viaturas estavam a uma vintena de metros apenas da linha de água! A própria pick-up do “Instituto de Socorros a Náufragos” lá do burgo, estava literalmente rodeada de outras viaturas! Ok! Para nos tranquilizar e garantir que não tínhamos sido vítimas de nenhuma alucinação, quiçá provocada por algum destilado de Ålborg, o hotel tinha brochuras de turismo da zona…, com fotografias de carros na praia!
Foto: Hirtshals (digitalização de brochura turística).
O ferry-boat que liga o continente à Islândia tem periodicidade apenas semanal e, nos dias de embarque, às terças-feiras de manhã, Hirtshals é pequena para tanto viajante!
De
manhã cedo, contornámos o centro da povoação pela zona campestre e dirigimo-nos
aos parques estacionamento, prontos para o embarque. É um ritual sempre engraçado.
Milhares de pessoas, de centenas de viaturas e motos (O “MS-Noröna", da Smyril
Line, tem capacidade para oito centenas de viaturas e estava esgotado!), em
amena cavaqueira, com os veículos abertos... Viajantes apenas. Uns em trabalho,
outros também não. Gente que procura conhecer outras paragens, outras culturas,
outras gentes, outros climas… de uma forma diferente, de carro. De carro, de
mota, de mota com side-car, de
“jipe”, de “jipe” transformado em auto-caravana, de camião off-road transformado em auto-caravana…
“Quem são?... De onde são?... De onde veem?... Que voltas
vão dar?... Que veículo trazem?... Quantos quilómetros já lhe fizeram?... Que
modificações lhe fizeram?... Por onde já andaram?...”
Quando,
muitos meses antes, reservámos as passagens no ferry-boat, a operadora tinha-nos dito que desde há muito que não
se recordava de terem transportado um veículo português! E despertámos a
curiosidade por virmos de tão longe e com um veículo já com duas décadas e com
mais de trezentos mil quilómetros… Mas, pelo menos nesse dia, não éramos os que
vínhamos de mais longe…
Uns
simpáticos americanos, já bem entrados na idade, estavam a meio da “The world
auto tour”, com início em Tokio e terminus
em San Francisco, com um saltinho à Islândia. Seguiam o trajecto possível da “George
Schuster 1908 Great Race”, a bordo de um… Plymouth Roadster… de 1928. Nem se
dava pela passagem do tempo, tantas eram as peripécias que tinham para contar!
Fotos: Hirtshals.
Tivemos sorte com os humores de Neptuno que nos presenteou com um autêntico “mar de senhoras” durante todo o trajecto até às Faroe e daí até Seyðisfjörður, na costa Leste da Islândia. É certo que estávamos no Verão…, mas sempre se atravessava mais de meio Atlântico Norte e as imagens e vídeos que tínhamos visto… eram bem “animadas” e ilustrativas do que pode ser o Atlântico Norte.
Um
“mini-cruzeiro”, em que apenas nos abstivemos de usufruir dos jacuzzis a “céu aberto”, deixando-os
para os nórdicos mais “esquimós”, que viam naquele frio e ventania atlânticas
um tórrido Verão!
Fotos: “MS-Noröna".
Fotos: “MS-Noröna". Passagem nas Faroe e escala em Torshavn.
Segunda etapa, na
terra do gelo e do fogo
– Islândia de
lés-a-lés –
Desembarcámos
em Seyðisfjörður ao início da manhã. Formalidades de desembarque, com a polícia
a questionar-nos se pretendíamos pescar na Islândia e a colocar-nos no
pára-brisas o respectivo auto-colante de controlo, que ainda por lá se mantém. Não!
Não pretendíamos pescar na Islândia.
Dois
dedos de conversa com o Andrew da “Venture 4x4”, que aguardava por clientes que
iriam fazer um programa de duas semanas organizado pela sua empresa, e seguimos
até ao topo do fjord de Seyðisfjörður
por entre paisagens magníficas, que iriam marcar o quotidiano das nossas
próximas duas semanas.
Em Egilsstaðir,
a maior “cidade” da zona Leste da ilha, fundada no pós-guerra e com pouco mais
de dois mil habitantes, a “caravana” separou-se, com a generalidade das motos,
carros, “jipes” e auto-caravanas “Todo-o-Terreno” a seguirem para o Sul.
Entrámos
na “Ring Road # 01” (“Hringvegur”, ou “Estrada Nacional IS-01”)… e rumámos a
Norte.
A “Hringvegur”
é “a” estrada da Islândia. Contorna a parte principal da ilha ao longo de mil e
quatrocentos quilómetros, está quase toda asfaltada, os cursos de água que
atravessa já têm pontes e, a partir dela, acede-se à maioria dos pontos mais
emblemáticos. Alguns troços não são transitáveis nos períodos de mau tempo e a
velocidade máxima permitida, nas zonas boas e com tempo “favorável” é de 90
km/h… Curvas e lombas “cegas”, zonas só com uma faixa de rodagem (especialmente
nas pontes) e troços dos anos quarenta do século passado, especialmente na zona
Leste, são… normais. É também nesta zona Leste que se concentram os troços
ainda não asfaltados.
Parando
aqui e acolá, cruzámos rapidamente os planaltos de montanha do Nordeste.
Próximo de Grímsstaðir, que detém o recorde da temperatura mais baixa registada
na Islândia (-24,2 ºC), virámos para o vale do rio Jökulsá á Fjöllum, o segundo
maior da Islândia, com mais de duas centenas de quilómetros, entre o glaciar
Vatnajökull e o Mar da Gronelândia. Queríamos visitar o seu impressionante
complexo de cascatas, a Selfoss, a Dettifoss e a Hafragilsfoss, assim como
seguir pelas gargantas de Ásbyrgi, tudo em pleno Parque Natural de Jökulsárgljúfur.
Deixámos o asfalto e tomámos contacto com as primeira dezenas de quilómetros de “corrugations”, “tôle ondulée”, “chapa ondulada”, ou o que lhe quisermos chamar. Tudo abanava, tudo trepidava. Parecia que o “Pantera Negra” se ia desintegrar. Encontrar o compromisso ideal de velocidade que minimizasse estas vibrações não era imediato, especialmente em estradas sinuosas… Até porque, ir demasiado depressa, com o veículo quase a “planar” sobre o relevo da picada, se é verdade que reduzia a trepidação sentida no habitáculo, também reduzia a aderência… Este foi, sem margem para dúvida, o aspecto menos positivo que encontrámos nas centenas de quilómetros que percorremos nas “estradas” islandesas não asfaltadas.
Habituámo-nos
desde logo também a que, salvo honrosas excepções, o que se queria ver ficava
quase sempre longe (não raras vezes a quilómetros!) do ponto onde os veículos
tinham que estacionar… As botas de montanha que levávamos não tiveram descanso.
Começámos
pela cascata Dettifoss… Impressionante! Uma das maiores cascatas da Europa, em
termos de volume de água (os islandeses dizem mesmo que é a maior). O trilho
levou-nos mesmo junto à água, o que aumentou o impacto da experiência.
Continuando
pelo mesmo trilho, menos de dois quilómetros a montante chegámos às cascatas de
Selfoss. Para nós, estas foram as mais bonitas cascatas que vimos em toda a Islândia.
São, no entanto, das cascatas menos visitadas, pois a maioria dos turistas
poupa-se aos quilómetros adicionais e fica-se pela Dettifoss. Das dezenas de
pessoas que estavam a ver e fotografar a Dettifoss, só nós os três fomos até à
Selfoss. Não sabem o que perderam… Para além das cascatas, o trajecto é de
enorme beleza e riqueza geológica, como aliás, tudo na Islândia.
Entretanto,
quando já estávamos para sair, os “jovens” do Plymouth Roadster de 1928
chegaram ao estacionamento. Também tinham seguido para a zona do Norte. Ainda
os tentámos convencer a palmilhar os quilómetros que os separavam da Selfoss,
mas ficámos com a “vaga certeza” de que se ficariam apenas pela zona da
Dettifoss…
Seguimos então para a cascata de Hafragilsfoss, continuando depois pelo Parque Nacional de Jökulsárgljúfur até às gargantas de Ásbyrgi, um canyon de uma centena de metros de profundidade talhado em forma de ferradura pelas águas do rio Jökulsá á Fjöllum.
Fotos: Zona das cascatas de Hafragilsfoss.
Fotos: Zonas do Parque Nacional de Jökulsárgljúfur e gargantas de Ásbyrgi.
Regressámos à “Hringvegur” pelo lado Oeste do vale, por uma “F-Road”. As estradas “F”, de fjall (montanha), só podem ser percorridas por veículo de tracção total e costumam só estar transitáveis durante uma parte do curto Verão islandês. Esta, neste Verão, tinha sido aberta há poucas semanas, as suficientes para, por exemplo, os cursos de água que atravessámos… estarem já secos.
Seguimos
depois para a zona do sistema de vulcões do Krafla. Passámos pela Central
Geotérmica (similar à de São Miguel, nos Açores, onde também trabalha uma
equipa de técnicos Islândeses), cujo desenvolvimento esteve parado durante anos
devido a actividade sísmica e vulcânica no local. Com uma potência instalada de
60 MW, é a Central Geotérmica mais potente do país. Subimos um pouco mais até à
Víti, uma cratera alagada do dito sistema Krafla. As águas do lago no seu
interior haviam subido cerca de dois metros, devido a um deslizamento de terras
e rochas ocorrido dois dias antes.
Voltámos a descer o Krafla e seguimos para a zona geotérmica de Hverarönð (também parte do referido sistema vulcânico), uma espécie de “furnas” açorianas no meio de uma enorme extensão lamacenta e borbulhante. Crucial não sair dos trilhos. Muita gente não recuperou das queimaduras na lama a ferver…
Depois de quase meia-hora a tirarmos a lama quente das botas, subimos o Námafjall e entrámos finalmente nos domínios do lago Mývatn, o “Lago das moscas” devido aos milhões (biliões?!) que enxameiam toda a área em certas alturas do Verão. Até se vendem máscaras de protecção!
Criado
por uma imensa erupção vulcânica há 2.300 anos, o lago é hoje um dos mais
importantes e ricos ecossistemas da Islândia, rodeado de paisagens e formações
vulcânicas e nascente do rio Laxá, rico em trutas e salmões, que desagua na
costa Norte. Toda a zona integra uma reserva natural que concentra em si uma
amostra de quase toda a diversidade do que se pode encontrar na Islândia. É
também uma zona privilegiada de férias para os islandeses, mas com escassa
oferta de alojamentos. Apesar de termos marcado tudo com meses de antecedência,
só conseguimos alojamento em Laugar, vinte e tal quilómetros a Oeste da zona do
Mývatn.
Estabelecemos em Laugar a nossa base para os próximos dias de exploração da zona. O “hotel” mais não era do que um liceu / colégio interno que, no período de férias escolares, era rentabilizado com turistas. Ideia interessante e habitual por aquelas bandas.
Ainda a acordar do deslumbre do primeiro dia, como “em Roma sê romano”, no dia seguinte não me esquivei ao repto de rematar o pequeno-almoço com um valente “shot” de óleo de fígado de peixe… au naturel. Livra, que aquilo sabia mesmo mal! Muito mal! Mas um português que se prezasse não poderia desiludir a simpática islandesa que afiançava que aquela mistela fazia muito bem à saúde…
Voltámos
a subir o Laxá, a contornar as margens Oeste e Norte do Mývatn e estacionámos o
“Pantera Negra” frente às instalações da MýFlug Air, no aeródromo de Reykjahlíð.
Parece que era a primeira vez que por ali se via um veículo de matrícula
portuguesa e, ao que nos contaram, éramos também os primeiros clientes
portugueses. A receber-nos, uma simpatiquíssima luso-islandesa, filha de mãe
portuguesa e pai islandês. Ia ser o nosso piloto. Lá fora, um Cessna 206
Stationair, o “Sport Utility Vehicle" do ar, aguardava-nos. Não podia ter
havido melhor alinhamento! Na hora seguinte deslumbrámo-nos com as vistas aéras
do lago Mývatn e zonas circundantes, Námafjall, Hverarönð, sistema vulcânico de Krafla,
cascatas de Selfoss, Dettifoss e Hafragilsfoss, gargantas de Ásbyrgi, Parque
Natural de Jökulsárgljúfur… Tudo o que ontem tínhamos visto de terra, esta
manhã apreciámos do ar durante uma hora. Imperdível! Sublime! Divinal! A
repetir, sem dúvida!
Claro
que o meu deslumbre de criança a virar-me para fotografar para tudo quanto era
lado, tinha de ter consequências… A dada altura começou a vir-me à boca aquele
gostinho ao óleo de fígado de peixe do pequeno-almoço… Ui! Toca a ficar muito
direitinho, a abrir um pouco a janela do cockpit
e a apenas apontar a máquina fotográfica para a zona a fotografar, sem me
atrever sequer a desviar os olhos do horizonte… Não cheguei a ter de usar o
“saquinho”, mas confesso que os últimos minutos de voo foram duros e acho que
saí do avião um pouco a dar para o “branco”! Na fila de trás a coisa também foi
agreste, com a “mais velha” a ter mesmo de fazer bom uso do tal “saquinho”
(que, no início do voo disse não precisar…) e a “mais nova” a mudar de cores e
a guardar o seu próprio “saquinho” do olhar cobiçoso da “mais velha”, mas a
aguentar-se até ao fim, in extremis…
O ar gélido fez milagres e, em poucos minutos, já estávamos prontos para outra. Despedimo-nos da equipa da MýFlug Air, demos uma volta pela cidade (Reykjahlíð é uma cidade de… trezentos habitantes permanentes…), abastecemo-nos no supermercado e seguimos para a margem Leste do lago Mývatn.
Primeiro
destino… Grjótagjá, uma pequena gruta de lava com nascentes termais no seu
interior. Ao que nos contaram, um dos episódios da saga “Game of Thrones” foi
aqui filmado. Deixámos em terra a ideia de aqui dar um mergulho, pois as águas
ainda se mantinham muito quentes. Escaldavam, para ser mais preciso! A intensa
actividade vulcânica da zona nas décadas de setenta e oitenta do século passado
fez subir a temperatura destes lençóis freáticos e, embora tenha vindo a descer
desde então, ainda não permitia veleidades. Deixámos o mergulho para daqui a uns anos...
Depois
de mais um “pic-nick with a view”, seguimos para a cratera de Hverfjall, o
ponto alto da tarde.
Resultado
de uma fortíssima erupção vulcânica há 2.500 anos, a cratera tem mais de
quatrocentos metros de altura e um perímetro de cerca de três quilómetros e
duas centenas de metros. O acesso ao topo só é permitido por dois trilhos estreitos
e íngremes e a maioria dos turistas apenas faz a subida e a descida, pelo
trilho mais fácil. Escusado será dizer que, para bem “resmoer” o almoço,
optámos por subir (e descer) pelo trilho mais difícil e, não contentes com
isso, percorrer todo o perímetro da cratera. Sábia decisão, pois fomos
presenteados com as mais belas vistas (com os pés na terra!) que se podiam ter
sobre o lago Mývatn e toda a paisagem vulcânica circundante. E claro, fizémos o "erfið leið"!
Fotos: Zona do lago Mývatn - Cratera de Hverfjall.
Seguimos
para mais uma aula de geologia em Dimmuborgir, um labirinto de formações de
lava com as formas mais estranhas, uma autêntica “cidadela negra”. No parque de
estacionamento o “Pantera Negra”, de novo, atraía as atenções… A matrícula
portuguesa, o modelo pouco comum na ilha (e ainda bastante limpinho e cuidado
nesta fase da viagem), o pequeno auto-colante com os países já visitados, tudo fazia
sucesso. Mas não, não estava à venda!
Fotos: Zona do lago Mývatn - Dimmuborgir.
Dalí,
rumámos para o Parque Natural de Höfði, em pleno lago Mývatn. Um pequeno
paraíso… infestado de moscas em algumas zonas, claro.
Dedicámos
o resto dia a deambular pelas margens do lago e terminámo-lo a relaxar nos 38
ºC a 40 ºC das águas alcalinas das piscinas geotérmicas de Jarðböðin, a versão
local da Lagoa Azul de Reykjavík…, só que com vistas sobre o lago Mývatn. Retirar
as “tropas” de dentro de água não foi tarefa fácil… e acabámos a jantar por ali
mesmo.
Nos
planos iniciais da nossa estadia nesta zona em torno do lago Mývatn, equacionámos
também uma visita à cratera de Askja, nas montanhas de Dyngjufjöll… Só que, “no
terreno”, constactámos que a volta nos ocuparia um dia inteiro, com a incerteza
adicional de podermos não conseguir atravessar alguns dos rios, cortesia do
nosso amigo Bárðarbunga e das suas “actividades” sob os gelos… Esquecemos
Askja, portanto.
Este
terceiro dia foi, assim, dedicado ao eixo Aldeyjarfoss – Húsavík.
Começámos
pelas impressionantes cascatas de Goðafoss, no rio Skjálfandafljót. Reza a
história que, algures no ano 1.000 da nossa era, a Assembleia Legislativa
islandesa, o Alþingi, adoptou, após intenso debate, o Cristianismo como
religião oficial unificadora e pacificadora de toda a Islândia (podendo as
religiões pagãs continuar a ser praticadas em privado). Þorgeir
Ljósvetningagoði, então um sacerdote das antigas religiões e chefe de Clã,
ter-se-á também convertido ao Cristianismo e, no regresso à sua quinta de Ljósavatn,
neste local terá simbolicamente lançado às águas algumas estátuas das antigas
divindades pagãs. A cascata passou então a ser conhecida como a “cascata dos
deuses”, Goðafoss. Por curiosidade histórica, tentámos indagar qual o nome
anterior da cascata, mas não tivemos sucesso. Ninguém nos soube informar.
Fotos: Zona das cascatas de Goðafoss.
Rumámos
a Sul, ao longo da margem direita do rio Skjálfandafljót, em demanda das
cascatas de Aldeyjarfoss. Voltávamos às extensas pistas de terra e gravilha e
às dezenas de quilómetros de “tôle ondulée”…
Mais
uma vez, o “Pantera Negra” teve de ficar a quilómetros do que queríamos ver… Seguimos
a pé, por terreno variado, paisagens de cortar a respiração e… nunca mais
encontrávamos as ditas cascatas. Por fim lá nos cruzámos com uma família que
vinha de lá. Íamos no bom caminho! Alguns deles traziam as tais máscaras de
protecção contra as moscas do Mývatn… Não tardámos a perceber porquê. Apesar de
já estarmos longe do lago, a zona era húmida e na meia hora seguinte, apesar
das doses generosas de repelente, tivemos milhares de seres esvoaçantes por
companhia!
As
moscas do Mývatn não são perigosas, nem existem casos reportados de transmissão
de doenças graves. Mas são “chatas”, picam e têm o hábito de depositar ovos na
pele, que depois produzem larvas, etc…
Convém não facilitar…
“… The flies are ’Black flies’ also
known as ‘midges’. They don´t bite, but they sting and put larvae. Not really
dangerous, but very annoying. (…) You should always have fly net available,
that way you are pretty safe. (…) They are all around the lake region, but
worst nearer the lake. By having a fly net available, people are usually not
bothered by the flies. A good tip, is to have your face as much in the wind as
possible, since they will be more on the lean side of your head…” – in Trip
Advisory
Entretanto, mesmo antes de atracarmos em Seyðisfjörður, aquele pessoal da “Extreme Iceland” e da “Venture 4x4” tinha-me dito que o pico das ditas moscas tinha sido uns dias antes, pelo que não chegou a ser necessário comprarmos as tais máscaras. Muito planeamento! Curiosamente, onde fomos mais “atacados” pelas ditas foi mesmo nesta zona das cascatas de Aldeyjarfoss, já a alguma distância do Mývatn…
Pouca
gente visita estas cascatas, pois ficam fora dos circuitos turísticos
habituais. Éramos os únicos que ali estávamos. As cascatas de Aldeyjarfoss não
têm o esplendor e o impacto das que havíamos visto anteriormente, mas são
também de uma grande beleza e as formações basálticas que as rodeiam dão mais
um importante capítulo do livro de geologia da ilha.
Regressámos
ao carro por outro caminho, para evitarmos as moscas…
Estávamos
na parte inicial da rota de Sprengisandur que, tal como as rotas de Kjölur e de
Kaldidalur (que iríamos percorrer nos dias seguintes), fez parte das três mais importantes
rotas de montanha que uniam as zonas remotas do Norte da ilha com as planícies
de Þingvellir onde, anualmente, no Verão, se reunia a Assembleia Legislativa, o
Alþingi. Com as recomendações que nos deram e fomos confirmando nestes dias,
voltámos para trás e rumámos a Norte, agora pela margem esquerda do rio
Skjálfandafljót e por mais umas dezenas de quilómetros de “tôle ondulée”, com
destino a Húsavik.
Fotos: Trajecto e zona das cascatas de Aldeyjarfoss.
Húsavík
é a capital do “whale watching” na Islândia. Várias espécies de baleias
costumam até entrar nas águas da sua baía e, não raras vezes, ser observáveis
da costa. Como já tínhamos andado atrás de baleias nos Açores, nas zonas do
Faial e do Pico, optámos por visitar antes o Hvalasafnið á Húsavík, o melhor
museu baleeiro que alguma vez vimos, e desfrutar desta simpática cidade
costeira com… dois mil e duzentos habitantes. Escusado será dizer que esta
viagem teve algum impacto na nossa noção de “cidade”…
De
manhã, ainda em Laugar, tinham-nos falado do Húsavík Mærudagar, o “Festival dos
Doces” que decorria, precisamente, neste último fim-de-semana de Julho! A
cidade era dividida em três zonas, a que eram atribuídas as cores verde,
laranja e rosa. As pessoas, então, decoravam as casas, as lojas, os postes de
iluminação, as árvores (e até elas próprias!) com motivos associados a
doçaria…, nas cores de cada zona. Concursos à parte, e até achámos que a zona
em que estávamos (“verde”) era a melhor decorada, este era “o” festival anual
da cidade, com desfiles, concertos de música, torneios de golfe, restaurantes
abertos até tarde… Animação para todos.
Degustámos
aqui a melhor sopa de peixe que alguma vez nos serviram, num restaurante em
pleno porto de Húsavík, que numa das paredes tinha um quadro com a seguinte
frase…
“Never get so busy making a
living, that you forget to make a life”.
Entretanto,
do outro lado do porto, altas labaredas e uma espessa coluna de fumo negro
indiciavam o pior. Para mais, em fim-de-semana de festa. Um forte incêndio
tinha deflagrado mesmo por detrás do edifício de controlo e apoio à pesca…
Alguma agitação no restaurante, com toda a gente a “sacar” dos telemóveis e a
fotografar a cena, mas não se viam veículos de bombeiros em lado nenhum.
Terminado
o belo repasto e lá fomos com os demais pelo porto fora, no meio da “movida de
Húsavík”, em direcção à festa… e ao incêndio!
Qual
incêndio?! Uma fogueira “de chegar ao Céu” no meio de um descampado, vigiada
pelos bombeiros, era o centro das atenções! À volta, para além da multidão
(“multidão”, para os standards da
Islândia), duas bandas itinerantes, com palco completo em cima de camiões,
animavam as hostes! Super-práticos, estes islandeses! Passadas duas horas o
descampado estava em paz. Os camiões tinham arrancado, a “movida” debandado e
apenas a fogueira ainda ardia a bom arder.
O
dia seguinte foi mais de etapa de ligação até Blönduós. Seguimos por outra via
até à “Hringvegur” e por aí continuámos. Sempre em vias panorâmicas, um regalo
para a vista!
Passámos junto ao Samgönguminjasafnið, em Ystafelli, o mais antigo museu de transportes da Islândia. Mas era domingo de manhã e não se via vivalma...
Passámos junto ao Samgönguminjasafnið, em Ystafelli, o mais antigo museu de transportes da Islândia. Mas era domingo de manhã e não se via vivalma...
Almoçámos
em Akureyri, a “Capital do Norte”, mesmo no final do fjord Eyjafjörður, o maior da ilha. Akureyri já entrou melhor nas
nossas antigas definições de cidade. Tem um pouco de tudo e, como aliás por
quase todos os lados por onde passámos, bastantes manifestações de arte, o que
é louvável e admirável…, embora que o Lonely Planet (segundo um amigo nosso, o
Nuno Sanches, “o livro mais optimista do mundo”) tenha uma nota de pertinente
sabedoria…
“… while it’s
laudable that the town celebrates its artists and authors, many of these
institutions are of limited interest, unless you have a particular admiration
for a specific artist’s work…”
Comprovámos
in loco e subscrevemos a dita nota!
Fotos: Zona de Norðurárdalur.
Fotos: Zona de Skagafjörður.
Fotos: Zona de Borgarvirki.
Hvítserkur
é uma formação rochosa, basáltica, que se ergue no mar a poucas dezenas de
metros da falésia e que serve de poiso e local de nidificação a centenas
(milhares?) de aves marinhas. Diz-se por lá que a rocha se parece com um
dinossauro a beber… Mas achámos mais autêntica a tradução directa de Hvítserkur,
“camisa branca”, em alusão às escorrências de guano…
Com
a rodagem que já levávamos de palmilhar trilhos agrestes, não deixámos as cores
nacionais por mãos alheias e, claro, não nos ficámos apenas pelo miradouro no
topo da falésia e descemos (e subimos!) todo o trilho talhado nas escarpas até
ao mar. Vista do nível das águas, a Hvítserkur impressiona.
Fotos: Zona de Hvítserkur.
Fotos: Zona de Blönduós.
Islândia
é, em grande medida e como não nos cansamos de repetir, natureza, paisagem,
sensações! Uma reserva natural global! Por questões de protecção ambiental é
estritamente proibido fazer todo-o-terreno... Acontece que, como comprovámos ao
longo destes dias, muitas das vias não são asfaltadas... Muitas delas são
"exigentes"... E um apreciável número de rios glaciares não tem
pontes... É conveniente algum planeamento e dois dedos de conversa com os
nativos... Voltei a falar com o pessoal da “Extreme Iceland” e da “Venture 4x4”
(sempre super-impecáveis!), agora sobre o estado da rota Kjölur, que este ano
apenas tinha ficado transitável há duas ou três semanas atrás. Estava
perfeitamente transitável, embora alguns dos desvios e ramificações fossem de
evitar se seguíssemos “a solo” e num veículo standard, como era o caso…
O
trajecto, tecnicamente fácil e em que os maiores cursos de água já têm pontes,
não deixa de ser o paraíso de buracos, pedras, “tôle ondulée”, ou tudo à
mistura. Sendo uma estrada “F”, só permite veículos de tracção total e une a
zona de Blöndúos com a zona de Geysir, passando entre os glaciares Langjökull e
Hofsjökull. Foram cerca de duas centenas de quilómetros que nos deram uma
pequena amostra dos desertos de rocha e lava do interior da Islândia. Em alguns
pontos, a flora começava já a ganhar algum terreno, ainda timidamente. Estávamos,
literalmente, no meio do nada e quase sem nos cruzarmos com quem quer que fosse.
Sentimos aquela estranha sensação dos grandes espaços, quase infinitos e que,
se a um tempo nos libertavam e catapultavam os nossos maiores sonhos, a outro
nos oprimiam e faziam pensar. Cruzámos as “vast badlands”, terras inóspitas e
desde há um milénio receadas por todos, durante séculos apenas habitadas por
gigantes, trolls e foragidos à lei,
berço de grande parte das lendas do folclore islandês. Mas os tempos são outros
e parece que já nada disso perdura. Algures, encontrámos um abrigo de montanha
de emergência. Ali, uma máquina de terraplanagem solitária dava testemunho do
esforço inglório de arranjo das zonas piores da pista, autêntico trabalho de
Sísifo. Acolá, um pequeno café com um abrigo para quem leve saco-cama e lá
necessite pernoitar… Parámos, claro! O ambiente, acolhedor, como em toda a
ilha. O cafezito que bebemos, horrível, como em toda a ilha! Ainda assim, nada
mais, só os grandes e intermináveis espaços.
Sensivelmente
a meio da rota Kjölur, fizemos um pequeno desvio até à zona geotermal de
Hveravellir, plena de fumarolas e borbulhantes nascentes de água quente. Situada
precisamente entre os glaciares de Langjökull e Hofsjökull, é considerada uma
das mais belas áreas geotermais do mundo. Parece também que, para além dos
gigantes e dos trolls, um dos mais
famosos foragidos islandeses por aqui se abrigou no século XVIII… Ainda
equacionámos um mergulho na pequena piscina natural de águas quentes. Mas o
vento glacial que se fazia sentir e quase nos arrastava, aconselhou-nos a
manter a roupinha junto ao pelo e a seguir caminho!
Fotos: Rota de Kjölur e "arredores".
Fotos: Rota de Kjölur e "arredores" - Zona geotermal de Hveravellir.
Fotos: Rota de Kjölur e "arredores".
Chegámos
às cascatas de Gullfoss já ao final do dia. Entrávamos naquele círculo de
belezas naturais que são o que apenas visitam noventa e muitos por cento de
todos os turistas que demandam a Islândia e se alojam na capital. Para eles, a
Islândia resume-se ao que conseguem visitar num dia, de carro ou de autocarro, a
partir de Reykjavík… As cascatas de Gullfoss, o Parque Natural dos Geysers de
Haukadalur e o Parque Natural de Þingvellir. É o chamado “Golden Circle”, a que
se costuma juntar a Lagoa Azul, no caminho do aeroporto. Muito pouco!
Os
miradouros sobre a cascata de Gullfoss estavam ainda com imensa gente. É uma
cascata muito bela, em escada, num canyon
do rio Hvítá. A cascata mais conhecida da Islândia, provavelmente também a mais
famosa e uma das belezas naturais do mundo. Hoje, é um lugar protegido. Durante
o século XX, contudo, esteve várias vezes “em cima da mesa” a sua utilização
para produção de electricidade… Felizmente que a falta de dinheiro para o
projecto obrigou a arrepiar caminho! Claro que, ou não estivéssemos na
Islândia, existe uma lenda muito mais apelativa que atribui os créditos da
defesa da cascata a Sigríður Tómasdóttir (filha do ex-proprietário dessas
terras, Tómas Tómasson) que, ao que consta, terá ameaçado lançar-se na dita
cascata se o projecto de produção de electricidade avançasse. Existe até um
pequeno monumento à senhora.
Aguardámos
um pouco, até que o grosso das hordas de turistas debandasse, e apreciámos
então devidamente a magia do local. Só faltou um raio de Sol, para que a
Gullfoss nos pudesse também brindar com os seus famosos arco-íris!
Fotos: Rota de Kjölur - Zona das cascatas de Gullfoss.
Depois,
rumámos até ao Parque Natural dos Geysers de Haukadalur, quase ali ao lado,
onde pernoitámos.
Os
maiores geysers do parque são o
Geysir, o mais “famoso”, que dá o nome a estes fenómenos e cujas erupções
conseguem lançar água fervente a setenta metros de altura, e o Strokkur, mais
pequeno, mas que ainda assim consegue lançar água a uma vintena de metros de
altura, havendo registos de erupções com o dobro da altura. Enquanto o Strokkur
mantém uma periodicidade “confiável” em torno dos seis minutos, o Geysir
consegue passar anos sem dar um ar de sua graça. O parque, contudo, não se
esgota nestes dois geysers. Outros
fenómenos geotérmicos como piscinas de lama fumegante, fumarolas, piscinas com
depósitos de algas coloridas e, inclusive, outros geysers menores, fazem parte do menú.
Desde o século XVIII que estes geysers
são, muito provavelmente, a maior atração turística da Islândia.
Ficámos
no antigo Hotel Geysir e o “Pantera Negra” conseguia ser o veículo mais sujo de
todos os ali estacionados! Entre o brilho imaculado daqueles veículos que
apenas tinham feito a estradinha desde Reykjavík, a camuflagem de água suja de
pó de lava, lama, erva e restos de neve, fazia extrema. Depois, era um carro
velho e, ainda para mais…, com uma matrícula Portuguesa! Ficámos bem cotados
nessa noite. Ou não…
Fotos: Rota de Kjölur - Parque Natural dos Geysers de Haukadalur.
Bem
recuperados da longa rota Kjölur, reservámos para o dia de hoje dois pontos
altos, o Parque Natural de Þingvellir e o glaciar de Langjökull.
Seguimos
ao longo do lago Laugarvatn e entrámos no parque pela zona norte do Þingvallavatn,
o maior lago natural do país.
As
planícies de Þingvellir são atravessadas pela falha tectónica entre as placas
americana e euro-asiática, claramente visível, activa e com a zona de
Almannagjá a formar mesmo uma espécie de pequeno canyon. Dando um pouco mais de “corda aos sapatos”, valeu a pena
dar também uma espreitadela à cascata de Öxaráfoss.
Este
é, provavelmente, o local mais importante da história da Islândia. A Assembleia
Legislativa anual islandesa, o Alþingi, reuniu-se aqui entre 930 e 1.798. Os
momentos mais marcantes da história do país ocorreram aqui e o local é quase
“sagrado” para os islandeses. Þingvellir foi classificado pela UNESCO como
Património da Humanidade com base em critérios culturais. Em breve sê-lo-á certamente
também por critérios geológicos.
Encontrámos
à entrada do parque os primeiros portugueses com que nos cruzaríamos em toda a
Islândia. Simpatiquíssimos, tinham acabado de chegar e ainda estavam a fazer
planos para o melhor aproveitamento da semana que por cá iriam permanecer.
Recomendámos-lhes que, se pudessem, não deixassem de visitar a zona do Mývatn.
Não
sabemos se foram estes portugueses, se outros que não tenhamos visto. O certo é
que quando voltámos ao “Pantera Negra”, tínhamos um post-it no espelho com a menção…
“Ganda maluco!!!”
Guardamos
ainda hoje, com muito carinho, esse post-it…
Voltámos
às estradas não asfaltadas e optámos por fazer um desvio pelo glaciar
Langjökull, o segundo maior da Islândia, logo após o Vatnajökull.
Seguimos
pelo caminho de montanha de Kaldidalur, que tem a segunda mais elevada passagem
de montanha da Islândia, a 727 metros. Não é uma estrada “F”, mas a
generalidade das companhias de rent-a-car
só permitem a utilização de veículos de tracção total nesta via, e percebeu-se
bem porquê!
Passámos
entre quatro glaciares, o Eiríksjökull, o Okjökull, o Langjökull e o
Þórisjökull, e também atravessamos mais um daqueles desertos rochosos, em que o
tímido avanço da flora já lhe começa a emprestar um tom esverdeado. A rapaziada
da “Venture 4x4” e da “Extreme Iceland” tinha-nos alertado para as súbitas
tempestades de areia da zona que, em segundos, transformavam as sublimes vistas
numa nuvem impenetrável de poeiras e detritos… “Não saiam do jipe!”. Mas os deuses estavam connosco e as nuvens só
tinham mesmo, água.
Fotos: Rota de Kaldidalur - Zona de Ármannsfell.
Fotos: Rota de Kaldidalur.
Parámos
o “Pantera Negra”, literalmente, no meio das pedras. Sem crampons, nem piolets,
sozinhos e sem conhecer o glaciar, não nos aventurámos demasiado, claro.
Deambulámos um pouco pelos gelos, a apreender e a absorver o momento. O gelo
vidrado, nas zonas mais transparentes, permitia até ver algumas crevasses e
também os escoamentos de água que corria na sua base. Estávamos, de novo, no
meio do nada. Sublime! Dava para sentirmos alguma “humidade” nos olhos… Reacção
ao vento gélido, claro!
O
regresso da neblina cerrada aconselhou-nos, contudo, a sair dali. Ainda
tínhamos umas dezenas de quilómetros até ao próximo encontro com o asfalto…
Fotos: Rota de Kaldidalur - Zona do glaciar Langjökull.
Estando
aqui, não podíamos deixar de ir a Reykolt prestar homenagem Snorri Sturluson,
escritor e historiador, político influente que moldou o futuro da Islândia na
primeira metade do século XIII. A pequena povoação é um dos lugares históricos
de referência por aquelas latitudes e preserva várias construções associadas à
vida de Snorri Sturluson, entre elas, a piscina de águas quentes e o túnel que
lhe dava acesso… e onde o homem foi “silenciado” pelos seus detractores. Tempos
tramados aqueles.
Fotos: Zona de Reykholt.
Nas
duas noites seguintes estabelecemos a base em Borgarnes e os jantares no
pequeno, mas magnífico restaurante do museu “The Settlement Center”. Alguns
amigos tinham-nos contado, à laia de piada islandesa, que os islandeses
adoravam pizzas e hamburguers… tão má era a sua gastronomia! Ainda hoje estamos
para saber qual a “Islândia” que esses nossos amigos conheceram… porque comemos
sempre muito, mas mesmo muito bem em toda a ilha!
Fotos: Zona de Borgarnes.
E
voltamos ao início da história e ao tal Jules Verne que usou o glaciar
Snæfellsjökul como cenário para o início da sua "Viagem ao Centro da
Terra". Dedicámos o dia a percorrer toda a península de Snæfellsnes e o
Parque Natural Snæfellsjökull, que também abrange uma extensa área marítima.
Apesar de relativamente próxima da capital, esta é uma parte do país pouco
visitada pelos turistas, que não sabem o que perdem.
As
evidências de actividade vulcânica são omnipresentes e, em algumas zonas, como
ao redor de Stykkishólmur, nem sequer se registam acumulações de neve porque a
lava…, ainda está quente! Para os islandeses, esta é também uma zona “mágica”,
com imensos fluxos de “energia”. Não somos muito dados a esoterismos, mas lá
que percorremos aquilo tudo, que subimos e descemos ao topo de crateras, que
atravessámos toda a montanha por duas vezes e que “estávamos para as curvas”,
lá isso é verdade! Até o Astro Rei se mostrou por diversas vezes!
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona de Grundarfjörður e da montanha Kirkjufell.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona de Ólafsvík.
Foto: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona de Hellissandur.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona da cratera de Saxhóll.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zonas de Djúpalónssandur e Dritvík.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona de Lóndrangar.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona de Arnarstapi.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull - Zona de Búðir.
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull.
No final do dia, ainda fizemos uma longa paragem na antiga quinta de Ytri-Tunga para vermos uma colónia de focas. Ao que consta, estão habituadas aos seres humanos e vêm a terra com frequência, para deleite dos fotógrafos. Mas com uma família de turistas russos ali, aos berros uns com os outros e aos saltos de pedra em pedra…, as boas das focas lá observavam aqueles estranhos seres, mas dentro de água, à distância… Depois daquela troupe toda abalar, esperámos pacientemente. Os bichos até se aproximaram…, mas sempre dentro de água…
Fotos: Parque Natural Snæfellsjökull. As focas de Ytri-Tunga.
Reservámos
os dias seguintes para a capital, Reikjavík. Mas antes, não resistimos a seguir
pela estrada antiga e contornar todo o Hvalfjörður, o fjord das baleias. Não vimos as ditas, apesar de os nativos nos
terem confirmado que todos os anos várias baleias entram naquelas águas. Nem os
efeitos da Segunda Guerra Mundial, em que o fjord
serviu de base às forças navais americana e britânica, nem a fábrica de
transformação (de baleias) as afastou. Mas lá tivemos de nos contentar apenas com
as paisagens e com mais uma edição dos nossos “lunch with a view”!...
Devidamente rematados por um cafezinho da “Handpresso Auto” e, qual “cereja em
cima do bolo”, uns mililitros de “Jura Superstition” comprado no ferry.
Ao
início da tarde estávamos em Reykjavík, a capital da Islândia, onde reside mais de metade da população do país. Mesmo assim, para os standards a que estamos habituados, os 180.000 habitantes não fazem uma cidade grande. Optámos por alugar um acolhedor
apartamento no último andar de um pequeno edifício próximo da Catedral. O Tryggvi
e a Andrea, os jovens donos do edifício, eram absolutamente “cinco estrelas”,
para além de super-interessados e informados. Deu gosto conhecê-los! A cidade
não é muito grande e, dali, podia-se ir a pé a quase todo o lado!
Fotos: Fjord de Hvalfjörður, o fjord das baleias.
Os
dias em Reykjavík foram, essencialmente, para visitar os seus pontos
emblemáticos, conhecer e desfrutar da cidade e da sua “vida”, assistir a mais
um excelente concerto de órgão acústico na Catedral (actuação magistral de Maurice Clerc, um dos grandes nomes da actualidade nestas lides), dar umas voltas pelos
arredores e… repor energias também!
Fotos: Reykjavík.
Num
desses dias, para além de horas de molho na divinal Bláa Lónið, a “Lagoa Azul”,
um dos ex-libris da Islândia, em
pleno campo de lava de Grindavík, também aproveitámos para explorar a península
de Reykjanes.
A
Islândia situa-se sobre a cadeia montanhosa conhecida como “Dorsal Atlântica”.
Os limites das placas tectónicas Americana e Euro-Asiática são bem visíveis um
pouco por toda a ilha e, desde há milhares de anos que, com evidências que
demonstram a teoria da deriva continental, se continuam a afastar.
Queríamos
visitar a Heimsálfubrú, a “Ponte entre Continentes”, uma pequena ponte pedonal
sobre uma falha tectónica, ligando, precisamente e de uma forma simbólica, as
ditas placas Americana e Euro-Asiática. Construída em 2002, foi baptizada de
“Ponte de Leif, o Sortudo”, em honra de Leif Eriksson que terá, alegadamente,
navegado até ao continente americano cinco séculos antes de Cristóvão Colombo. Os "elementos" agrestes têm feito o seu trabalho e as placas informativas já pedem urgente substituição... Restou-nos a Internet para conseguirmos uma imagem da placa original da " Miðlína"...
O
mapa que tínhamos não era muito claro e, aparentemente, ninguém sabia onde
ficava a tal ponte… Nem os condutores dos autocarros! Por fim lá conseguimos
indicações mais precisas e demos com a coisa. Uma zona inóspita, marcada pela
actividade vulcânica. Formações de lava a perder de vista, e areia e poeira
basálticas um pouco por todo lado. O vento tinha amainado, mas diziam-nos que
era comum levantarem por ali enormes “nuvens” de areia, que mais pareciam de
fumo quando vistas à distância. Brincava-se também com os nomes dados, há um
milénio, à península e à própria capital… Reykjanes e Reykjavík, “península
fumarenta” e “baía fumarenta”, que de “fumo”, afinal nada tinham.
Fotos: Reykjavík - Bláa Lónið, a “Lagoa Azul”.
Fotos: Reykjavík - Península de Reykjanes - Heimsálfubrú, a “Ponte entre Continentes”.
Assim,
apontámos agulhas para a rota do Sul, seguindo essencialmente a “Ring Road #01”
e fazendo apenas uns quantos “desvios” para ver mais isto, ou mais aquilo.
Começámos
pela cascata de Seljalandsfoss, para muitos a mais bonita cascata da Islândia. Consegue-se,
inclusive, passar por detrás da queda de água! Mas, ainda assim, continuamos a
preferir a Selfoss, no Norte.
Fotos: Zona das cascatas de Seljalandsfoss.
.
Seguimos
depois para mais uma “lição de vida”, no “Centro de Interpretação do Vulcão Eyjafjallajökull”.
Todos nos recordávamos da erupção de 2010 que, para além de arrasar toda a
zona, criou o caos no tráfego aéreo do Atlântico Norte e Europa. Um pequeno,
mas intenso vídeo, mostrava a vida de uma pequena quinta familiar, mesmo ali ao
lado… Como tudo havia começado, o esforço de gerações, o apogeu e… a destruição
quase total com a última erupção do Eyjafjallajökull. Depois… Bem, depois…,
muita capacidade de sofrimento, muito trabalho, muito estoicismo, muita
entre-ajuda e…, quem hoje ali estivesse e olhasse para aquela quinta, pujante
de vida, nunca imaginaria o cenário de destruição de há apenas quatro anos. Como
referia o documentário, “life must go
on”!
Ainda
a “digerirmos” tudo o que tínhamos visto e aprendido. Ainda a pensarmos no que
poderia ter acontecido se a erupção do Eyjafjallajökull tivesse provocado a
erupção do Katla (muito maior e bem mais “perigoso”)… seguimos em silêncio até
às cascatas de Skógafoss.
O
“Astro-Rei” voltou a pregar-nos a habitual partida de se esconder atrás das
nuvens e, assim, mandar para as urtigas a perspectiva de um belo arco-íris nestas
magníficas cascatas. Também deixámos cair a ideia de recriar aquela fotografia
célebre com um jipe quase por debaixo das cascatas. Estava demasiada gente para
avançarmos para lá da placa… “Proibido passar”… Vingámo-nos de tanta “desfeita”
e trepámos até ao miradouro no topo da cascata. Vistas soberbas!
Depois da tradicional "fotografia de família" em Skógafoss, fomos dar uma espreitadela ao glaciar Sólheimajökull, uma língua do muito maior Mýrdalsjökull, que se estende até às planícies arenosas da costa Sul, por entre formações rochosas que parece terem sido talhadas a cinzel.
Seguimos depois para Vík í Mýrdal e para mais um daqueles “momentos National Geographic” nos rochedos de Dyrhólaey, uma conhecida zona de nidificação dos “Puffins”, os “Papagaios do Mar”. Estávamos todos a procurar os melhores ângulos e a posicionar os “zooms” para captarmos uma outra imagem mais ou menos decente, quando um casal de “Puffins” com os bicos cheios de peixes veio aterrar quase aos pés da nossa filha que, ante o espanto pelo insólito da situação, quase se esquecia de fotografar a cena!
Fotos: Zona das cascatas de Skógafoss.
Depois da tradicional "fotografia de família" em Skógafoss, fomos dar uma espreitadela ao glaciar Sólheimajökull, uma língua do muito maior Mýrdalsjökull, que se estende até às planícies arenosas da costa Sul, por entre formações rochosas que parece terem sido talhadas a cinzel.
Fotos: Zona do glaciar Sólheimajökull.
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Seguimos depois para Vík í Mýrdal e para mais um daqueles “momentos National Geographic” nos rochedos de Dyrhólaey, uma conhecida zona de nidificação dos “Puffins”, os “Papagaios do Mar”. Estávamos todos a procurar os melhores ângulos e a posicionar os “zooms” para captarmos uma outra imagem mais ou menos decente, quando um casal de “Puffins” com os bicos cheios de peixes veio aterrar quase aos pés da nossa filha que, ante o espanto pelo insólito da situação, quase se esquecia de fotografar a cena!
O
final da tarde presenteou-nos ainda com os incontáveis montículos de pedras de Laufskálavarða, ali colocados, segundo manda a tradição, por todos os viajantes que ali passam pela primeira vez em agradecimento / pedido pela viagem. Cumprimos a tradição, claro. Ao que nos disseram, o próprio instituto das estradas lá do sítio vai ali colocando umas carradas de pedras soltas para facilitar esse cumprir da tradição, sem ser necessário deambular por uma zona ambientalmente sensível em busca de... pedras.
Seguiram-se quilómetros de campos de lava. Um deles, o Eldgjárhraun, com os seus cerca de 700 km2, originou-se no maior fluxo de lava de que há registo na Islândia, provocado pela erupção do vulcão Eldgjá no ano 934. As erupções na zona têm-se sucedido, claro, mas, entre cada ciclo de instabilidade, a flora sempre tenta o seu trabalho de Sísifo… Vastas áreas encontravam-se já cobertas de uma espécie de musgo (“moss”), a primeira etapa na colonização da lava estéril. Comentávamos com a nossa filha outros exemplos de “recuperação” dos terrenos após erupções vulcânicas (tínhamos já visto vários casos (e.g., arquipélago dos Açores)) e que seria interessante voltarmos à Islândia daqui a, por exemplo, duas décadas para compararmos a evolução de todos estes locais…
Fotos: Zona de Laufskálavarða.
Seguiram-se quilómetros de campos de lava. Um deles, o Eldgjárhraun, com os seus cerca de 700 km2, originou-se no maior fluxo de lava de que há registo na Islândia, provocado pela erupção do vulcão Eldgjá no ano 934. As erupções na zona têm-se sucedido, claro, mas, entre cada ciclo de instabilidade, a flora sempre tenta o seu trabalho de Sísifo… Vastas áreas encontravam-se já cobertas de uma espécie de musgo (“moss”), a primeira etapa na colonização da lava estéril. Comentávamos com a nossa filha outros exemplos de “recuperação” dos terrenos após erupções vulcânicas (tínhamos já visto vários casos (e.g., arquipélago dos Açores)) e que seria interessante voltarmos à Islândia daqui a, por exemplo, duas décadas para compararmos a evolução de todos estes locais…
Fotos: Zona dos campos de lava de Eldgjárhraun.
Fotos: Zona de Kirkjubæjarklaustur.
Descanso
merecido em Kirkjubæjarklaustur, no que aparentava ser o único hotel em
centenas de quilómetros!
Continuámos
pelo eixo da “Ring Road #01”, com destino à lagoa glaciar de Jökulsárlon.
Paragens
nas cascatas de Foss á Siðu e nas colunas basálticas de Dverghamrar, e, depois
de atravessarmos os campos de lava de Skaftareldahraun e Nupahraun, chegámos à
quinta de Núpsstaður. A quinta preserva antigas construções características das
habitações islandesas de há bastantes séculos atrás… Que apenas puderam ser
fotografadas à distância, pois os acessos, privados, estavam interditos…
Fotos: Zona das colunas basálticas de Dverghamrar.
Fotos: Zona da quinta de Núpsstaður.
Fotos: Zona das planícies arenosas de Skeiðarársandur.
Fotos: Zona do glaciar Svínafellsjökull.
Fotos: Zonas de Hofskirkja e de Laekjarhus.
Fotos: Zona do glaciar Fjallsjökull.
Daqui
rumámos a Leste, desviando aqui e ali para chegarmos até às pontas mais
acessíveis dos vários glaciares e, a meio da tarde, estávamos na famosa lagoa
glaciar de Jökulsárlon.
Repleta
de icebergs que se desprendem do
glaciar, a lagoa é tida como uma das belezas naturais da Islândia e filmes como
“A View to a Kill”, “Die Another Day”, “Lara Croft: Tomb Raider” e “Batman Begins”,
tiveram cenas filmadas aqui.
À
medida que o glaciar Breiðamerkurjökull tem recuado, a lagoa tem-se expandido,
ocupando hoje uma área de cerca de duas dezenas de quilómetros quadrados. Para
além dos trilhos nas suas margens, a lagoa é visitável, quer em veículos
anfíbios (“restos de colecção” dos tempos da 2ª Guerra Mundial), quer em barcos
pneumáticos, tipo “Zebros”. Esta é, sem dúvida, a melhor opção. A viagem é
maior e consegue-se ir mesmo até à parede do glaciar.
Uma autêntica aula de natureza, a navegar por entre os icebergs e uma ou outra foca fugidia. Fomos
mesmo até onde a segurança o permitia, desligámos os motores e ficámos ali um
bocado, a ouvir as explicações do piloto (um professor de primeira água!), o
uivar do vento e a “voz do gelo” no glaciar. Por baixo de nós, duzentos e
sessenta metros de água gélida. Em frente, a “parede” do glaciar Breiðamerkurjökull. Momentos únicos. Fomos inclusivamente brindados por um
desprendimento de gelo e respectiva onda. Motores rapidamente postos a trabalhar
e ala dali para fora!
Devemos
ter sido dos últimos turistas a abandonar Jökulsárlon nesse dia. Pernoitámos
ali próximo e o que, quando da reserva, era apenas um bungalow… transformou-se numa simpática e acolhedora casinha, mesmo
junto ao mar. Éramos portugueses… e continuávamos a ser sempre super-bem
recebidos e tratados, em todo o lado. Sublime.
Quando
saímos para jantar, eu não me estava a entender com a fechadura (burrice minha,
que depois percebi que estava a fazer a coisa ao contrário…). Falei no caso à
recepcionista. Com o sorriso mais simpático e compreensivo do mundo (era mesmo eu
que estava a ser azelha…), disse-me…
“… Sim,
essas fechaduras costumam ter manias. Mas não se incomode, pode deixar aberta…”
Era
aquela adorável postura que sempre temos encontrado do meio da Europa para cima
e que sempre nos tem feito sentir na mais absoluta segurança. Roubos?
Furtos?... Não faz parte do léxico. Quando me esqueci da máquina fotográfica na
casa de banho de um café em Stykkíshólmur, a dita continuava no mesmo sítio
quando regressei a procurá-la… Quando a nossa filha se esqueceu da máquina
fotográfica no Centro de Interpretação do Vulcão Eyjafjallajökull, uma senhora
veio à procura dela para lha entregar…
Se
presenciarem um assalto na Islândia, chamem a “CNN”!
Começávamos
já a sentir saudades e ainda não tínhamos deixado a ilha. Iniciámos a última
etapa antes de embarcarmos, na manhã seguinte. Dirigimo-nos a Höfn í Hornafirði,
uma pequena cidade que se desenvolveu em torno do seu porto de pesca. Um porto
que, em Invernos mais rigorosos…, congela! Lá tivemos de fazer as honras ao bom
marisco por que a zona é conhecida e reconhecida, ou não estivéssemos na cidade
do Humarhátíð, o festival anual do marisco! Para os apreciadores das coisas da
geologia, uma visita ao Huldusteinn, um museu de “pedras”, fruto da dedicação e
trabalho de décadas de um simpático casal com paixão (e know-how) por estes temas, é incontornável.
Fotos: Zona de Höfn í Hornafirði.
Entrávamos
sem pressas e desviando aqui e ali, para vermos mais isto ou mais aquilo, na
zona dos fjords do Leste, uma área
imensa de enorme beleza e muito pouco visitada. O profundo relevo da costa
fazia-nos recordar a Noruega, que havíamos visitado três anos antes. A
nostalgia de final de viagem assaltava-nos impiedosamente.
Ainda
fizemos uma paragem mais demorada em Djúpivogur, que detém o recorde de
temperatura mais elevada da Islândia, com 31 ºC registados em Junho de 1939.
Atraíra-nos o museu de fósseis, com o fóssil quase completo de um enorme ichthyosaurus na entrada, assim como a
curiosa linha de trinta e quatro esculturas de grandes ovos ao longo da baía.
Representavam ovos de dinossauros, intuímos nós… Errado, revelou a pesquisa
(leitura das minúsculas placas explicativas, entenda-se…). Os Eggin í Gleðivík
mais não eram do que um curioso trabalho de um artista local, Sigurður
Guðmundsson, alusivo a cada uma das espécies de aves características de Djúpivogur…
Fotos: Zona de Stafafell.
Fotos: Zona de Hvalnes í Lóni.
Fotos: Zona de Djúpivogur.
Fotos: Zona do fjord de Berufjörður.
Fotos: Zona de Stöðvarfjörður.
Com tudo isto, o dia já ia longo e ainda estávamos longe do destino. Demos gás ao “Pantera Negra”. Já na descida em estradinha de montanha para Seyðisfjörður, levantou-se um nevoeiro de final de dia que não deixa ver nem a ponta do capôt…
Tínhamos feito esse mesmo percurso duas semanas antes, a subir.
Ainda nos lembrávamos bem do trajecto, das vistas soberbas… e de algumas “pequenas
escarpas”! Foi aí que o GPS deu, mesmo, uma ajuda preciosa! Seguir em frente
por cinquenta metros…, virar à direita…, gancho à esquerda… E lá chegamos,
bastante tempo depois…, à dita e simpática Seyðisfjörður.
A Islândia está super-bem sinalizada. Com um bom mapa e os
habituais dois dedos de conversa com os nativos, chega-se a todo o lado e
encontra-se tudo o que se pretende, mesmo nos sítios mais remotos (no Verão,
pelo menos!). Como a TomTom não tinha cartografia para a Islândia, não me
preocupei a arranjar outro GPS. Afinal de contas, tinha os mapas em papel, a
bússola, um telefone satélite e nada mais seria necessário. Pelo sim, pelo não,
carreguei o mapa do país no “Here Drive+” do telemóvel… just in case. Wise decision!
Como que à laia de despedida e para nos deixar ainda mais
saudades, Seyðisfjörður presenteou-nos com a última noite da temporada dos “Sumartónleikar
Bláu kirkjunnar”, os concertos de Verão da igreja azul. Para fechar a época,
nada mais, nada menos do que a mais famosa banda de blues da Islândia, o sexteto “Blúsband Björgvins Gíslasonar”.
Absolutamente cinco estrelas!
Embarcámos na manhã seguinte, uma manhã gélida e com um nevoeiro que quase não deixava ver o ferry-boat. Neptuno voltou a ser um “tipo porreiro” e manteve o Atlântico à rédea curta… Dois dias depois desembarcávamos em Hirtshals.
Fotos: Zona de Seyðisfjörður .
Terceira etapa, rumo
a casa
– Atravessar meia
Europa, agora a “descer” –
Desembarcámos
à hora de almoço, como previsto e sem atrasos. A “descida” da Dinamarca fazia
lembrar um género de “corrida”… Toda a gente com uma pressa inaudita de chegar
ao destino e com o pé direito a fundo. Fazer uma ultrapassagem para quem, como
nós, seguia calmamente na casa dos 120 km/h
era uma “aventura”! Arranjar um “buraco” na fila de carros a “mil à hora”
que seguiam “a dois dedos uns dos outros” na faixa da esquerda era obra! E
depois… somos nós, em Portugal, que conduzimos perigosamente… Pois!
Ficámos
nessa noite nos arredores de Hamburg. Não chegámos a aproveitar a cidade.
Queríamos antes fazer uma escala maior em Amsterdam…
A
cerca de meia centena de quilómetros de Osnabrück ouvimos no rádio que havia um
engarrafamento de cinquenta quilómetros no auto-estrada para Osnabrük! Oooops!
Tudo parado… Saímos na primeira saída que nos surgiu e continuámos por aquelas
estradinhas campestres absolutamente maravilhosas… e lentas!
Só a
meio da tarde chegámos ao destino! Depois de nos habituarmos a partilhar a via
com eléctricos, camionetas, automóveis, motos, bicicletas e peões lá
encontrámos o hotel… que tinha garagem.
Amsterdam
dispensa apresentações. É difícil não gostar da cidade, pelo menos no Verão!
Mais uma daquelas cidades em que ninguém se importaria de viver, estudar,
trabalhar. Quando, dois dias depois, nos fizemos de novo à estrada, no
para-brisas do “Pantera Negra” estava um cartão da Administração do hotel a
agradecer a nossa presença, esperando que tivesse sido do nosso agrado e…
desejando-nos uma excelente viagem de regresso a Portugal. Um mimo, só para nós!
Escala
em Poitiers. Associávamos sempre a cidade ao “Parc du Futuroscope” e nem
imaginávamos a simpática e bem cuidada cidade que se escondia lá no alto. Como
curiosidade, ficámos a saber que a Língua Portuguesa é ensinada na Universidade
de Poitiers e no Instituto de Ciências Políticas.
Nestas
duas últimas etapas, resolvemos seguir pelas montanhas e passar pela capital da
província de Navarra, Pamplona, que nunca tínhamos visitado. Mais conhecida
pelas festas de San Fermin, Pamplona tem contudo uma rica história milenar e
uma arquitectura que merece uma visita.
Fotos: Pamplona.
Tínhamos
marcado a última noite em Valladolid mas, sem ter dito nada à família…, estava
com ideias de ficarmos antes no Palácio do Marqués de Riscal, em Elciego, em
plena região de Rioja. Já tínhamos visitado uns anos antes, em Bilbau, o Museu Guggenheim,
provavelmente a mais conhecida e importante obra de Frank Ghery na Península
Ibérica. Queríamos agora visitar e desfrutar doutra obra do mesmo magistral
arquitecto, o Hotel Marqués de Riscal. Design,
arte, gastronomia, vinho e uma paisagem impressionante alinhavam-se para uma
experiência a não esquecer. Como “cereja em cima do bolo”, a perspectiva de
tirar uma fotografia ao “Pantera Negra” no pátio do hotel, ao estilo da tirada nesse
mesmo ano para o lançamento da última geração do modelo…
Avançámos
para a cancela da portaria… Sai um guarda fardado… Cumprimentos da ordem…
- Têm reserva?
- Não, mas…
- Então não podem passar. Têm de estacionar ali no
parque.
- Mas o hotel tem uma recepção, certo? Uma recepção onde
se fazem reservas, certo?
- Tem, mas têm de estacionar ali no parque e falarem ali
na adega.
Bem,
vejamos… Estamos a meio da tarde… Chega uma família num veículo com matrícula
estrangeira… Essa família manifesta interesse em pernoitar no hotel… O “bronco”
do guarda nega o acesso e despacha a dita família para uma adega, pertencente
(ou não!) ao mesmo grupo empresarial… Enfim! Claro que não armámos qualquer
“confusão” e dirigimo-nos à tal “bodega” onde também verificámos ser difícil a
comunicação com a recepção do hotel…
Escusado
será dizer que mantivemos a reserva em Valladolid (podíamos cancelá-la até às
17h00)! Imenso espaço para melhorar, na gestão do dito Hotel Marqués de Riscal!
E,
bem vistas as coisas, até gostámos imenso de Valladolid!
Como
não estávamos suficientemente cansados depois de uma dezena de milhar de
quilómetros ao volante, ainda chegámos a “casa” a tempo do fim-de-semana das
Festas de Nossa Senhora da Assunção de Ortiga, um daqueles eventos de Verão das
nossas vilas e aldeias, a que não se pode mesmo faltar!
Fotos: "Lar, doce lar", e... duas dúzias de países!
Takk fyrir!
Luís de Matos
(Setembro de 2014)